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Medicina Vitale

Esclerose Múltipla: uma doença silenciosa e cheia de pré-conceitos

A EM não é uma doença mental, não é contagiosa, não é suscetível de prevenção, não tem cura e seu tratamento consiste em atenuar os feitos e desacelerar a progressão da doença. 

A Esclerose Múltipla (EM) é uma doença crônica do sistema nervoso central que afeta o cérebro e a medula espinhal.

De acordo com a National Multiple Sclerosis Society, a Esclerose Múltipla afeta cerca de 2,5 milhões de pessoas no mundo. E conforme a Associação Brasileira de Esclerose Múltipla, no Brasil são aproximadamente 35 mil pessoas diagnosticadas com a doença. Um levantamento feito pelo DATASus aponta que somente 13 mil estão em tratamento atualmente. A EM é considerada uma doença de adultos jovens, já que na grande parte dos casos são diagnosticados entre os 20 e 40 anos, tendo maior incidência em mulheres.

Por ser uma doença autoimune, a Esclerose Múltipla ocorre quando o sistema imunológico ataca e destrói tecidos saudáveis do corpo por engano. A doença autoimune é uma desordem imunológica que diminui a tolerância aos componentes do próprio organismo. Isso ocorre em virtude de uma alteração no processo de diferenciação de agentes externos (ex: vírus e bactérias) e os do próprio organismo. As causas das doenças autoimunes ainda são desconhecidas. Acredita-se que fatores externos estejam envolvidos nas ocorrências.

O QUE É ESCLEROSE MÚLTIPLA?

A Esclerose Múltipla é uma doença inflamatória do sistema nervoso central. Considera desmielinizante, ou seja, lesa a bainha de mielina e é prejudicial a neurotransmissão. Conforme explica o neurologista José Carlos Tomiozzo Junior (CREMERS 35902), a bainha de mielina é uma espécie de isolamento das fibras nervosas (axônios). Ela permite que os nervos transmitam seus impulsos rapidamente. Isso por sua vez auxilia na condução das mensagens que controlam os movimentos conscientes e inconscientes do organismo.

“Na Esclerose Múltipla o corpo produz algumas substâncias que ativam as células de defesa do corpo. Elas por sua vez atacam a bainha de mielina. O que deixao o nervo vulnerável e sem conseguir conduzir a informação para o resto do corpo. Resultando em surtos que podem deixar ou não sequelas”, explica.

Para exemplificar, imagine que seu cérebro é uma central telefônica e a bainha de mielina a capa que reveste o fio que conduz a informação do seu cérebro para o resto do corpo. Os portadores de EM possuem essa capa de revestimento danificada. Como se estivesse quebrada em alguns pontos. Sendo assim, a informação repassada do cérebro para o corpo pode conter alguns ruídos. Que variam em cada caso podendo ser intensos e prejudicar o entendimento total ou não.

SURTOS

Os surtos são caracterizados por sintomas ou sinais neurológicos variáveis. Como a perda de força de um ou mais membros, formigamentos ou dormências em partes do corpo, distúrbios de sensibilidade, vertigem, tremores, alterações na fala, dificuldade para caminhar e desequilíbrio que se apresentam em diferentes combinações ou isoladamente. Em alguns casos o paciente apresenta quadro de neurite óptica, caracterizada pela redução na visão e dor ocular, com piora à movimentação dos olhos e ainda há registros de casos em que há perda de visão ou visão duplicada.

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Tomiozzo explica que em cada surto o quadro clínico é variável. Sendo que muitos pacientes apresentam mais de um sintoma associado. A recuperação também é individual Em alguns casos os pacientes apresentam remissão completa dos sintomas enquanto em outros podem permanecer com sequelas. Quando identificado o surto, é necessário que o portador de Esclerose Múltipla passe por pulsoterapia, que é a administração de altas doses de medicamentos por curtos períodos de tempo. Na Esclerose Múltipla utiliza-se a pulsoterapia com corticoides sintéticos, havendo em alguns casos a necessidade de internação hospitalar. Receber o diagnóstico e o tratamento precoces são essenciais para uma melhor recuperação do paciente pós-surto. O tratamento visa reduzir o tempo do surto e a gravidade dos sintomas.

Não há evidências de que o uso de corticoides evite a ocorrência de novos surtos ou interfira na evolução da doença. Portanto é necessário tratamento contínuo por meio do uso dos imunomoduladores, imunossupressores e anticorpos monoclonais, que visam modificar a evolução da doença e reduzir o número de surtos e consequentes sequelas, melhorando a qualidade de vida dos pacientes.

COMO IDENTIFICAR

O diagnóstico é basicamente clínico e é complementado por ressonância magnética e o médico ainda poderá solicitar outros exames para excluir condições que possam ter sinais e sintomas semelhantes.

Ressonância Magnética

Método de diagnóstico por imagem que usa ondas de radiofrequência e um forte campo magnético para obter informações detalhadas do cérebro, medula espinhal e outras áreas do seu corpo. Este exame pode revelar lesões relacionadas à perda de mielina no cérebro e medula espinhal.

Análise de sangue

Ajuda a excluir algumas doenças infecciosas ou inflamatórias com sintomas semelhantes aos da EM.

Punção lombar

Exame em que uma agulha é inserida na parte inferior das costas, a fim de remover uma pequena quantidade de fluido espinhal para análise laboratorial. O fluido é testado para identificar anomalias associadas à esclerose múltipla, tais como níveis anormais de células brancas do sangue. Através deste procedimento podem ser excluídas infecções virais e outras condições que possam causar sintomas neurológicos.

Exame de potencial evocado

Mede os sinais elétricos enviados pelo cérebro em resposta a estímulos. Esse exame pode usar estímulos visuais ou estímulos elétricos aplicados nas pernas ou braços. Ajuda a detectar lesões ou danos aos nervos dos olhos, tronco cerebral ou medula espinhal.

TRATAMENTO DA ESCLEROSE MÚLTIPLA

Apesar da doença não ter cura, muito pode ser feito para ajudar as pessoas portadoras de Esclerose Múltipla a terem uma vida confortável, independente e produtiva. Atualmente existem diversas opções de tratamento, que vão desde cápsulas orais de administração diária, até injeções diárias, semanais ou mensais.  Os mais comuns são:

  • Beta interferons – medicamentos como Avonex, Betaferon, Rebif. São medicamentos injetáveis, aplicados por via intramuscular. São as primeiras terapias modificadoras de doença usadas em EM.
  • Acetato de Glatiramer (Copaxone) – medicamento injetável na forma subcutânea (semelhante às injeções de insulina). Dose diária.
  • Fingolimod (Gilenya) – medicação em forma de comprimido tomado em dose única diária. Primeira droga oral dispnibilizada para EM, e exige, na sua primeira tomada, uma monitorização cardiológica mais próxima, pelo possível efeito colateral de queda dos batimentos do coração.
  • Natalizumab (Tysabri) – medicamento injetável, usado em casos que não respondem aos remédios acima. Utilizado em formas mais graves da doença.
  • Mitoxantrone – imunossupressor também usado em casos mais graves.

VITAMINA D E A ESCLEROSE MÚLTIPLA

Apesar de não ter o apoio da maioria dos médicos, um novo tratamento tem chamado a atenção nos casos de EM. É a administração de exclusivas e altas doses diárias de vitamina D. Há pouco mais de 15 anos o Professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), o médico neurologista Cícero Galli Coimbra, desenvolveu um método baseado quase exclusivamente na vitamina D para deixar seus pacientes livres dos surtos e sequelas da EM.

Em declarações na mídia, o médico afirma que a diferença entre a vitamina D e as drogas convencionais usadas no tratamento das doenças autoimunitárias é que ela é um imunorregulador, não um imunossupressor. O pesquisador defende que enquanto os outros medicamentos deprimem o sistema imunológico como um todo e deixam o organismo suscetível a infecções, a vitamina D é a única substância capaz de inibir seletivamente a reação chamada “th17”, causada pelas doenças autoimunológicas.

PESQUISAS E A VITAMINA D

Uma pesquisa feita em Harvard e publicada no Jama Neurology no ano de 2014 mostrou que a vitamina D contribui para uma progressão mais lenta da doença. O estudo apontou que pacientes em estágio inicial tiveram 57% menos risco de sofrer novas lesões cerebrais se apresentassem níveis adequados deste hormônio. Eles tinham 25% menos chance de sofrer com a piora das lesões existentes. Já um estudo da Harvard School of Public Health feito em 2006 aponta a diminuição de 41% do risco de esclerose múltipla para cada 50nmol/L aumentando os níveis de vitamina D.

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Independentemente de existirem no mundo aproximadamente cinco mil publicações sobre os benefícios da vitamina D na Esclerose Múltipla, ainda espera-se por estudos conclusivos que comprovem que esse pode ser um tratamento exclusivo. Da mesma forma, a Academia Brasileira de Neurologia (ABN) fez uma publicação em que recomenda realizar dosagem de vitamina D nos pacientes com esclerose múltipla, independentemente da fase da doença. Sobretudo em pacientes que fazem uso frequente de corticosteroides ou anticonvulsivantes. Por sua vez, afirmam na nota que níveis de vitamina D acima de 100 ng/mL no sangue periférico devem ser evitados até que novas definições sejam estabelecidas para a recomendações diárias do hormônio. O consenso da Academia Brasileira de Neurologia afirma, ainda, que não existem evidências científicas que justifiquem o uso da vitamina D como tratamento exclusivo para esclerose múltipla.

TIPOS DE PROGRESSÃO DA ESCLEROSE MÚLTIPLA

Recidivante Remitente – surtos imprevisíveis que podem ou não deixar marcas permanentes ou seguidos de períodos de remissão;

Secundária Progressiva – inicialmente EM Recidivante Remitente que entra subitamente em declínio sem períodos de remissão;

Primária Progressiva – aumento estável de degenerência sem surtos;

Primária Recidivante – progressão continua desde o aparecimento, mas com surtos ocasionais.

VIVENDO COM A ESCLEROSE MÚLTIPLA

Quem convive com a Esclerose Múltipla sofre com diversos pré-conceitos que envolvem a doença. A maioria da população acredita erroneamente, por exemplo, que esclerosado é alguém com problemas mentais e que receber esse diagnóstico significa aguardar a morte, que virá logo.

No entanto, quem tem Esclerose Múltipla vive normalmente e, por muitas vezes, passa dias sem lembrar que tem a doença. O corretor de imóveis Maurício De Césaro, 29 anos, confessa que a diferença após o diagnóstico, recebido no ano de 2012, é que agora ela  precisa cuidar mais da saúde. Em seu primeiro surto, Maurício perdeu temporariamente a visão de um olho, que recuperou depois do tratamento.

“Eu nunca cuidei muito da minha saúde até receber o diagnóstico. Dieta totalmente desregrada, sem atividade física, poucas horas de sono e consumo de álcool em exagero em alguns finais de semana. Como diz o Dr. Lair Ribeiro: Se você não tem tempo pra cuidar da sua saúde, um dia terá que encontrar tempo pra cuidar de sua doença e hoje eu cuido dela e vivo bem”, conta.

Para o jovem, a maior dificuldade é reprogramar a vida. Já que ao receber o diagnóstico o peso de ainda ter pouca informação sobre a doença torna as coisas mais difíceis.

“Assim como eu não sabia, a população ainda desconhece o que esta doença causa. Esclerose Múltipla não causa demência nem é doença de louco, não é contagiosa e não é doença de velhos (-Aquele velho Esclerosado). Não tem nada a ver! Atualmente a medicina está muito desenvolvida e a cada ano novos tratamentos surgem para que os pacientes possam ter cada vez mais qualidade de vida”, desabafa.

Grupo dos Portadores de Esclerose Múltipla de Passo Fundo

Após ser diagnosticada, Marília criou o Grupo dos Portadores de Esclerose Múltipla de Passo Fundo, que reúne cerca de 60 pessoas de Passo Fundo e região. O objetivo do grupo é prestar apoio e dividir os desafios da doença, além de reivindicar por medicamentos quando a Secretaria de Saúde do Estado atrasa os prazos de entrega.

“Eu gostaria de poder transformar o grupo em uma associação, para arrecadar fundos e podermos oferecer esse atendimento aos pacientes, para que possam viver da melhor maneira possível a ponto de esquecer que são portadores de EM”, pontua a professora aposentada.

Memórias de um esclerosado

Rafael Corrêa (39) é um importante quadrinista gaúcho reconhecido mundialmente. Diagnosticado em 2010 com EM, Rafael passou a relatar a sua vida com a doença através dos quadrinhos. Semanalmente ele conta sua história, dificuldades e desafios na página fb.com/ memoriasdeumesclerosado .

CUIDANDO DO CORPO

Especialmente relevante, vale lembrar que existem nutrientes que são capazes de melhorar a capacidade de hidratação dos neurônios diminuindo o atrito e a ocorrência dos surtos. De acordo com a nutricionista Jureci Machado, os alimentos considerados antioxidantes, ou seja, que melhoram a capacidade de absorção pelos neurônios, são eficazes para amenizar esse atrito e melhorar a capacidade de “comunicação” entre eles.

“Incluir na alimentação elementos com esses potenciais antioxidantes como uva, frutas vermelhas em geral, maçã, aveia, peixe, óleo de peixe podem melhorar a qualidade de vida de quem sofre com Esclerose Múltipla”, explica.

Vale lembrar que a presença de agrotóxicos nos alimentos, gorduras do tipo trans e saturadas e gorduras de origem animal também são considerados vilões para portadores de EM, uma vez que podem potencializar os surtos. Igualmente o consumo de doces também pode ser perigoso se em excesso.

“Por isso, procure manter uma alimentação variada. Dê prioridade a alimentos na forma orgânica, mantendo a introdução de frutas e verduras distribuídas entre as refeições. Considere também a inclusão de cereais integrais, como aveia, linhaça, gergelim, chia. Não há uma necessidade de dieta rigorosa com restrição total de alimentos. Portanto basta o equilíbrio no consumo, mantendo a dieta habitual sempre repleta de nutrientes”, esclarece a nutricionista.

Ingra Costa e Silva
Jornalista  MTB/RS 17087
 

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